Por que, cargas d’água, nasce cabelo no meu queixo?
E, mais… Por que eu gosto tanto disso?
Biólogos propõem que os pêlos exerceram um papel natural no processo de seleção sexual. Charles Darwin, o barbudo pai da teoria da evolução, acreditava que o cabelo que cresce no rosto funcionava como um indicador de maturidade sexual. Se estava ou não legislando em causa própria, não cabe a análise aqui!
Mas, o fato é que a barba é um indicador de testosterona, e é por conta dela que os homens tendem a ter mais pelos no rosto que as mulheres. Este hormônio é responsável por favorecer a maior parte das características masculinas.
A barba é um protetor natural para o rosto masculino, e isso é um significado prático para o uso mas, também traz embutido o significado social e estético.
Todas as ações buscam apresentar algo. Atos, falas e comportamentos comunicam alguma coisa para alguém, mesmo que inconsciente, ações geram comunicação. Isso não é diferente quando se fala do uso ou não da barba. Essa comunicação apontou para diferentes conceitos durante a história humana.
No Egito Antigo, por mais que se observe imagens onde os pelos são totalmente retirados, os nobres, por exemplo, tinham na barba um sinal de seu status. Mas, não usar barba não era demérito.
Já os gregos, basta olhar as esculturas, sempre usaram barba, aliás, era muito comum o uso das barbas, ela apontava para a sabedoria dos que usavam, uma barba vistosa era um símbolo de conhecimento. A exceção acontecia no exército de Alexandre, o Grande. Ele proibiu os pelos por considerar as barbas longas como um ponto fraco no momento do combate corpo a corpo.
Na antiga Roma dos Césares, a barba era usada em um importante ritual de passagem. Quando os primeiros fios começavam a nascer nos rostos dos meninos, iniciava-se o momento de passagem entre duas etapas de suas vidas. A partir deste instante, os jovens, não poderiam cortar nem o cabelo e nem a barba. Somente quando atingiam a puberdade raspavam todos os pêlos do corpo e os ofereciam aos deuses. Os senadores romanos costumavam preservar a barba como símbolo de seu status político. Nessa mesma sociedade surgiram os primeiros cremes de barbear, produzidos através do óleo de oliva.
Na Idade Média a barba passou a ser sinônimo de virilidade e honra entre os nobres, em contraste a cara sem pelos usada pelos clérigos da Igreja Católica Romana, que naquela ocasião, era considerada um sinônimo de celibato.
Por conta disso, os senhores barbudos, anunciavam às donzelas que eles não só não fizeram voto de castidade como também estavam disponíveis para possíveis relacionamentos.
Lutero, o nome mais conhecido da Reforma Protestante, e que foi excomungado pelo Papa Leão X, comunicou, à todos que podiam ver, o seu rompimento com Roma, deixando, por exemplo, a barba crescer, por mais que, na maioria das pinturas que temos do reformador, não haja a barba. Interessante notar como o poder da mensagem da barba é forte, depois de Lutero, praticamente todos os reformadores europeus deixavam suas barbas, afirmando que os pelos no rosto os aproximavam das imagens dos homens da igreja primitiva e, também, como sinal de rejeição à Igreja de Roma.
Mais ao norte da Europa, os Vikings usavam a barba como uma demonstração de imponência e força. Mantinham, para isso, barbas vistosas e bem cuidadas, usavam inclusive o óleo de baleia para hidratar os pelos do rosto. Muitos ostentavam jóias penduradas, que eram usadas até mesmo para prender os fios.
Outros personagens, como por exemplo, o Pirata Barba Negra, usavam o cabelo do rosto para assustar, para ele, quanto mais horripilante ele parecesse perante seus adversários, melhor seria. Mas, esta não era uma regra entre os piratas, outros, preferiam, principalmente quando desembarcavam, usar produtos misturados com rum para aliviar o odor dos dias de viagem.
A barba foi tão utilizada na idade média que em 1535, o rei britânico Henrique VIII criou um imposto sobre pêlos e sua filha, Elizabeth I, recriou a taxa. Contudo, na época da rainha, todos os donos de barbas com mais de 2 semanas de crescimento (vai saber como é que isso era medido) precisavam pagar um tributo à coroa inglesa.
Este tipo de imposto também já foi cobrado na Rússia, na tentativa de modernização da sociedade.
Entretanto, a barba não tem somente o caráter social ou estético, para muitas pessoas, ela tem o caráter religioso.
No judaísmo, a Torá proíbe a “destruição” do cabelo em cinco locais específicos da face. A chamada destruição, segundo o Talmude (coletânea de livros sagrados dos judeus), significa raspar os pelos com uma lâmina, especificamente lâmina, ou, qualquer objeto que faça ao pelo o mesmo efeito de o remover totalmente da facia, contudo, a regra não proíbe cortar os cabelos com uma tesoura ou outro instrumento que não traga o barbear fornecido por uma lâmina.
Esta não era uma prática comum entre eles antes da Lei Mosaica. Antes dela, o hebreu costumava se barbear. Em Gênesis 41.14 (o primeiro livro da Torá, e também o primeiro livro da Bíblia cristã) O faraó mandou chamar José, que foi trazido depressa do calabouço. E, depois de se barbear e trocar de roupa, apresentou-se ao faraó.
Mas, durante o êxodo dos hebreus, momento em que eles saíram do Egito, raspar a barba estava associado ao culto da região de Canaã. A barba comunicava a diferenciação religiosa. Por isso, os israelitas não podiam raspar a barba, mas, apará-la sim.
A barba não era importante para o judeu somente em seu território, ela também era sinal de reverência à Deus e às tradições pelos povos ao redor de Israel. Por isso, uma das formas de afronta contra o povo hebreu era o ato de retirar a barba de alguém daquele povo. Como, por exemplo, aconteceu com os mensageiros de Davi narrado em 2º Samuel 10.1-5:
Algum tempo depois, o rei dos amonitas morreu, e seu filho Hanum foi o seu sucessor.
Davi pensou: “Serei bondoso com Hanum, filho de Naás, como seu pai foi bondoso comigo”. Então Davi enviou uma delegação para transmitir a Hanum seu pesar pela morte do pai. Mas, quando os mensageiros de Davi chegaram à terra dos amonitas, os líderes amonitas disseram a Hanum, seu senhor: “Achas que Davi está honrando teu pai ao enviar mensageiros para expressar condolências? Não é nada disso! Davi os enviou como espiões para examinar a cidade e destruí-la”.
Então Hanum prendeu os mensageiros de Davi, rapou metade da barba de cada um, cortou metade de suas roupas até as nádegas, e os mandou embora.
Quando Davi soube disso, enviou mensageiros ao encontro deles, pois haviam sido profundamente humilhados, e lhes mandou dizer: “Fiquem em Jericó até que a barba cresça, e então voltem para casa”.
É lógico que isso gerou uma guerra.
Retirar a barba também era visto como sinal de repúdio e lamento, e foi usado várias vezes pelos profetas.
Hoje, vemos judeus barbudos mas, vemos grupos que não são tão barbudos assim. É que para alguns, o uso da tesoura e alguns outros instrumentos de corte são permitidos pois, ao interpretarem a Torá, o que Deus proibiu de fato foi o ato de passar a lâmina na pele a ponto de não haver mais vestígio de pelo. Por conta desses cuidados, existe um tipo de barbear exclusivo para judeus. O barbear Kosher!
Não é somente o judaísmo que tem na barba um sinônimo de devoção, segundo a lei islâmica, a barba só pode ser aparada quando atingir o tamanho de uma mão fechada.
Mufti Afzal Hoosen Elias, grande conhecedor da lei islâmica, entendeu que seria necessário apresentar aos muçulmanos uma orientação ao uso da barba, o nome do folhetim é “Sobre o Comprimento da Barba”.
O uso da barba no islamismo é uma forma dos homens sentirem-se mais próximos dos ensinamentos do profeta Maomé, ela não é algo trivial, mas, algo religiosamente importante, a ponto de ser passível da condenação eterna para aqueles que morrem após o abandono da barba, pois ela é sinônimo de purificação
Perceba que, muito mais que os fins estéticos, a barba traz consigo muitos outros significados, tanto sociais quanto religiosos. Usar ou não a barba não é somente uma questão de gosto mas, um processo de comunicação. O cabelo no queixo não é somente uma marca, é identidade.
Ah, uma curiosidade, no exército, raspa-se a barba por conta da uniformização e, também por conta da higiene. Quando se fala de higiene, diz-se em caso de guerra, lógico!
Por Cyssu Pantaleão